Em momentos como os
que vivemos, em que se presencia a destruição indiscriminada de
árvores antigas, para extração ilegal de madeiras nobres; em que
muitos ainda pensam mais em seus cofres e contas bancárias do que na
agressão ao meio ambiente, nada mais oportuno do que se falar do
amor à natureza.
Humberto de Campos, em
seu livro Memórias conta que, aos dez anos
de idade, a família se mudou para o Piauí, na cidade de
Parnaíba.
No dia seguinte ao da
mudança para a pequena casa, toda cheirando ainda a cal, a tinta
e a barro fresco, encontrou um amigo.
Humberto estava no
banheiro tosco, próximo ao poço, quando seus olhos descobriram no
chão, entre as pedras grosseiras, uma castanha de caju.
Ela acabara de
rebentar, inchada, no desejo vegetal de ser árvore. Dobrado sobre si
mesmo, o caule parecia mais um verme, um caramujo a carregar a sua
casca, do que uma planta em eclosão.
A castanha ainda
guardava as duas primeiras folhas úmidas e avermelhadas, como duas
joias flexíveis que tentassem fugir do seu cofre.
Com a autorização de
sua mãe, o pequeno Humberto plantou a castanha, a uns trinta ou
quarenta metros da casa.
Fez uma pequena cova,
enterrou aí o projeto de árvore e o cercou com pedaços de tijolo e
telha.
Regou-o e o protegeu
contra a fome dos pintos e a irreverência das galinhas.
Todas as manhãs, ao
lavar o rosto, deixava cair a água desse momento alegre sobre a
plantinha. Com afeto, acompanhou a multiplicação das suas folhas
tenras.
Três anos mais tarde,
Humberto se separou de seu amigo cajueiro pela primeira vez, para
residir no Maranhão. Anos depois, foi morar no Rio de
Janeiro.
Vez ou outra voltou à
Parnaíba para visitar o amigo.
Próximo de seu
regresso ao mundo espiritual, retornou para uma última visita ao seu
cajueiro e escreveu:
Ele não me conhece
mais. Eu estou homem; ele está velho. A enfermidade cava-me o rosto,
altera-me a fisionomia, modifica-me o tom de voz.
Ele está imenso e
escuro. Quero abraçá-lo e já não posso...
Então me volto e
parto. E me sinto a viver como ele, com os pés na lama, dando, às
vezes, sombra aos porcos.
Mas, também, às
vezes, dourado de sol lá em cima, oferecendo frutos aos pássaros e
pólen ao vento.
No milagre divino
do meu sonho, sangrando resina cheirosa, com o Espírito enfeitado de
flores que o vento leva e o coração, aqui dentro, cheio de mel e
todo ressoante de abelhas.
Humberto de Campos
desencarnou. O amigo fiel continuou a oferecer os mesmo frutos doces
de outrora.
Nos galhos retorcidos
pelo tempo, com a exuberância do seu verde vivo, a árvore centenária
ainda está lá, demonstrando que o amor se estende e prospera em
todos os reinos da natureza.
Ainda há muito amor a
exercitarmos no mundo para com nossa mãe natureza.
Redação do Momento
Espírita, a partir do artigo Meu cajueiro, publicado na
revista O espírita, de janeiro/abril
2009.