Pede-se
a uma criança: “Desenha uma flor!” Dá-se-lhe papel e lápis. A
criança vai sentar-se no outro canto da sala onde não há mais
ninguém.
Passado
algum tempo o papel está cheio de linhas. Umas numa direção, outras
noutras. Umas mais carregadas, outras mais leves. Umas mais fáceis,
outras mais custosas.
A
criança colocou tanta força em certas linhas que o papel quase não
resistiu. Outras eram tão delicadas que apenas o peso do lápis já
era demais.
Depois
a criança vem mostrar essas linhas às pessoas: uma flor! As pessoas
não acham parecidas essas linhas com às de uma
flor!
Contudo
a palavra flor andou por dentro da criança, da cabeça para o coração
e do coração para a cabeça, à procura das linhas com que se faz uma
flor. E a criança pôs no papel algumas dessas linhas, ou
todas.
Talvez
as tivesse posto fora dos seus lugares, mas, são aquelas as linhas
com que Deus faz uma flor!
* *
*
O belo
texto de Almada Negreiros - poeta e artista plástico português –
pode nos levar a várias reflexões.
A primeira
nos leva pelos caminhos de Antoine de Saint-Exupéry e seu
principezinho encantador, quando nos mostra a dificuldade
que a alma adulta tem para compreender o mundo infantil (como se
nunca tivesse transitado pela infância).
O aviador
de Saint-Exupéry, quando criança, não conseguia ser compreendido em
seus desenhos mirabolantes. Eram complexos demais para os
adultos...
Outra
nuance do poeminha nos leva a pensar sobre as potências de nossa
alma e de como temos, dentro de nós, todas as linhas para desenhar o
que bem desejarmos.
Os gérmens
da perfeição, das virtudes da alma, estão todos conosco desde que
fomos criados, buscando o tempo de serem desenvolvidos.
Assim como
as linhas desenhadas pela criança, nos primeiros momentos nos
parecem ininteligíveis, são os primeiros movimentos do ser humano
rumo à felicidade.
Os traços
vão se organizando com o tempo, com as encarnações, com os
aprendizados, e nossa flor no papel vai ficando cada vez mais bela e
mais próxima à figura original criada por Deus.
A perfeição
da flor desenhada nunca chegará a ser a da florescência Divina, pois
o Espírito alcança apenas uma perfeição relativa.
Porém, será
igualmente bela a flor desenhada pelo homem após as sucessivas
experiências na carne.
* *
*
Vivemos
para organizar os traços de nossa intimidade, buscando dar-lhes
aspectos harmônicos, inspirados e guiados pelas leis
Divinas.
A educação
nunca foi um ato de colocar algo para dentro de nós, e sim de
colocar para fora, desenvolvendo potencialidades.
A
etimologia da palavra educação nos mostra os termos: ex, que
significa para fora, seguido da expressão ducere, que se
entende por guiar, conduzir,
liderar.
Assim,
educar é conduzir, guiar, retirar de dentro de nós algo que está lá,
embrionário.
Olhemos
para dentro, cuidemos de nós, invistamos nosso tempo na evolução
espiritual e veremos esses traços bailando pelas telas do mundo
produzindo grandes belezas.
Temos
conosco os gérmens de todas as virtudes, de todas as flores de nossa
alma.
Redação do
Momento Espírita com citação do texto A flor, do livro
A invenção do dia claro, de José Sobral de
Almada Negreiros, ed. Assirio & Alvim.