Ela estava inconsolável, afirmava que fora vítima de
terrível ingratidão. Pergunte-lhe a razão e ela respondeu: Meu filho não quer
ser médico!
Chorando dizia que dedicara toda sua vida àquele jovem e
agora que ele crescera tornara-se um ingrato não realizando os sonhos que ela
sonhou.
Por que os filhos tem que tornar realidade o sonho dos
pais?
Ser pai ou mãe é diferente de acreditar-se proprietário
dos filhos e querer determinar o futuro deles. Muitos pais planejam o futuro
dos filhos sem consultar-lhes os ideais. Vai longo o tempo em que até o
casamento eram os pais que escolhiam.
Se uma criança do ensino fundamental tem oito matérias e
no final do bimestre tira uma nota vermelha, os pais massacram-na, valorizando
apenas a nota baixa, esquecendo-se das outras sete notas azuis.
Nós seres humanos, sempre nos detemos somente no que
acontece de pior, infelizmente. Fazer-se vítima de ingratidão dos filhos é ter
criado expectativas que só existiram dentro da cabeça dos queixosos. Cada ser
humano possui em si um universo de conhecimentos adquiridos em outras vidas.
Isso fica claro pela diversidade de comportamentos e aptidões que as crianças
apresentam, embora recebam a mesma educação e tenham nascido do mesmo pai e
mãe.
“O que provem da carne é carne, o espírito procede do
espírito”. Já diz o ditado popular, os dedos da mão não são iguais.
Não podemos criar expectativas sobre os nossos filhos ou
de quem quer que seja e fazer delas o motivo principal da nossa vida. Devemos
tomar muito cuidado com as expectativas que criamos com relação às pessoas,
seja qual for o tipo de relacionamento. Cada ser escolhe o caminho que deve
seguir e recebe da vida a oportunidade de que necessita para poder evoluir.
Não somos donos dos nossos filhos. São joias preciosas
que não nos pertencem e a qualquer tempo pode acontecer que tenhamos que as devolver.
Não existe ingratidão quando compreendemos que todos nós
somos livres para realizar as experiências que desejamos. Amar sem posse é a
melhor saída, para não dizer-se amanha vítima de ingratidão. Amparar sim,
dominar não, amar sim, possuir não.
Jamais teremos o poder de interferir nas experiências que
aqueles que amamos escolheram passar. Nossos filhos não são bibelôs para
dispormos na hora em que desejarmos. Ninguém é de ninguém. Se amarmos
verdadeiramente e não cobrarmos pagamentos por esse amor, não sofreremos desse
suposto mal, chamado ingratidão.
Estamos aqui para aprendermos a amar.
Algemas
Invisíveis – Adeilson Salles – Editora CEAC